Serenity, Daniel Pollera
"De entre todas as coisas do mundo, umas há que dependem de nós,outras não dependem de nós.
As que dependem de nós são as nossas opiniões, os nossos movimentos, os nossos desejos, numa palavra, todas as nossas acções. As que não dependem de nós são o corpo, os bens, a reputação, numa palavra, todas as coisas que não se incluem entre as nossas acções.
As coisas que dependem de nós são livres por natureza, nada as pode fazer parar ou obstruir; aquelas que não dependem são fracas, escravas, sujeitas a mil condicionalismos e a mil inconvenientes, e são-nos inteiramente alheias.
Lembra-te, pois, que se tu tomas por livres as coisas que são por natureza dependentes, e por próprias aquelas coisas que dependem dos outros, encontrarás obstáculos por toda a parte, cairás em aflição, ficarás perturbado e lastimar-te-ás dos deuses e dos humanos; ao contrário, se consideras teu o que depende de ti, e alheio o que depende dos outros, jamais alguém poderá forçar-te a fazeres aquilo que não queres, nem poderá impedir-te de fazeres aquilo que tu queres. Então não te lastimarás de ninguém, não acusarás ninguém, não farás nada contra a tua vontade, ninguém poderá prejudicar-te e não terás inimigos.
Primeiramente, quando imaginas alguma coisa deplorável, é preciso que estejas pronto a dizer-lhe: tu não passas de uma imaginação, não és aquilo que pareces.
Em seguida, examina bem (isso que imaginaste), aprofunda esse exame, e para poderes fundamentar o que imaginas serve-te das regras que aprendeste, sobretudo da primeira, que é a de saber se aquilo que te aparece ( na imaginação) pertence ao número das coisas que dependem de nós, ou se não depende. Se ela se inclui entre o número das que não dependem de nós, pensa, sem fraquejar, que isso não te diz respeito."
Epicteto, Manual, I-VI.
Epicteto, 55-135 D.C.
Ao reler um texto desta natureza e atendendo à sua antiguidade, não posso deixar de notar a sua actualidade, assim como a sua pertinência. O ideal da ataraxia será, sem dúvida, um dos mais úteis, hoje. Num tempo de sobressaltos permanentes, faz-nos falta, não digo uma total ataraxia, muito discutível, mas um pouco dela, isso faz certamente uma falta incrível. Digo eu, na minha modesta opinião, uma em infinitamente mil no universo opinativo da blogosfera. O que conduziria a outra questão, a do fundamento das opiniões. Outras considerações...
O pensamento de Epicteto insere-se numa corrente filosófica geralmente designada por estoicismo, a qual pode ser muito polémica mas que, quanto a mim, no mínimo, contém alguns princípios admiráveis. Úteis para quem goste de reflectir um pouco e talvez mesmo imprescindíveis para a acção...
A quem possa interessar, um excelente texto que resume a filosofia estóica, pode encontrar-se aqui
e ainda sobre Epicteto, alguns dados podem ser recolhidos aqui
A poesia de Ricardo Reis possui toda uma atmosfera de inspiração estóica. O poema a seguir transcrito é um dos que prefiro de R.R. :
O pensamento de Epicteto insere-se numa corrente filosófica geralmente designada por estoicismo, a qual pode ser muito polémica mas que, quanto a mim, no mínimo, contém alguns princípios admiráveis. Úteis para quem goste de reflectir um pouco e talvez mesmo imprescindíveis para a acção...
A quem possa interessar, um excelente texto que resume a filosofia estóica, pode encontrar-se aqui
e ainda sobre Epicteto, alguns dados podem ser recolhidos aqui
A poesia de Ricardo Reis possui toda uma atmosfera de inspiração estóica. O poema a seguir transcrito é um dos que prefiro de R.R. :
Mestre, são plácidas
Todas as horas
Que nós perdemos.
Se no perdê-las,
Qual numa jarra,
Nós pomos flores.
Não há tristezas
Nem alegrias
Na nossa vida.
Assim saibamos,
Sábios incautos,
Não a viver,
Mas decorrê-la,
Tranquilos, plácidos,
Tendo as crianças
Por nossas mestras,
E os olhos cheios
De Natureza...
À beira-rio,
À beira-estrada,
Conforme calha,
Sempre no mesmo
Leve descanso
De estar vivendo.
O tempo passa,
Não nos diz nada.
Envelhecemos.
Saibamos, quase
Maliciosos
Sentir-nos ir.
Não vale a pena
Fazer um gesto.
Não se resiste
Ao deus atroz
Que os próprios filhos
Devora sempre.
Colhamos flores,
Molhemos leves
As nossas mãos
Nos rios calmos,
Para aprendermos
Calma também.
Girassóis sempre
Fitando o Sol,
Da vida iremos
Tranquilos, tendo
Nem o remorso
De ter vivido.
Todas as horas
Que nós perdemos.
Se no perdê-las,
Qual numa jarra,
Nós pomos flores.
Não há tristezas
Nem alegrias
Na nossa vida.
Assim saibamos,
Sábios incautos,
Não a viver,
Mas decorrê-la,
Tranquilos, plácidos,
Tendo as crianças
Por nossas mestras,
E os olhos cheios
De Natureza...
À beira-rio,
À beira-estrada,
Conforme calha,
Sempre no mesmo
Leve descanso
De estar vivendo.
O tempo passa,
Não nos diz nada.
Envelhecemos.
Saibamos, quase
Maliciosos
Sentir-nos ir.
Não vale a pena
Fazer um gesto.
Não se resiste
Ao deus atroz
Que os próprios filhos
Devora sempre.
Colhamos flores,
Molhemos leves
As nossas mãos
Nos rios calmos,
Para aprendermos
Calma também.
Girassóis sempre
Fitando o Sol,
Da vida iremos
Tranquilos, tendo
Nem o remorso
De ter vivido.
Ricardo Reis, Odes