“ No dia em que uma estátua é acabada, começa, de certo modo, a sua vida. Fechou-se a primeira fase em que, pela mão do escultor, ela passou de bloco a forma humana; numa outra fase, ao correr dos séculos, irão alternar-se a adoração, a admiração, o amor, o desprezo ou a indiferença, em graus sucessivos de erosão e desgaste, até chegar, pouco a pouco, ao estado de mineral informe a que o seu escultor a tinha arrancado.
Marguerite Yourcenar, “O Tempo, esse grande escultor”
E ainda:
(...) Por vezes a erosão do tempo e a brutalidade dos homens unem-se para criar uma aparência única que não pertence a nenhuma escola e a nenhum tempo: (...).
Rodin, Les Bourgeois de Calais
Os nossos pais restauravam as estátuas; nós tiramos-lhes os narizes falsos e as próteses que lhes acrescentaram; os nossos filhos farão com certeza outra coisa. O nosso ponto de vista actual representa ao mesmo tempo um ganho e uma perda. (...) Mas esse gosto exagerado do restauro que caracterizou todos os grandes coleccionadores a partir do Renascimento, e durou quase até aos nossos dias, tem razões mais profundas do que a da simples ignorância ou o convencionalismo ou gosto grosseiro do arranjo. Talvez mais humanos do que nós, pelo menos no campo das artes, em que procuravam sensações felizes, possuidores de uma outra sensibilidade, os nossos antepassados não gostavam das obras de arte mutiladas, das marcas de violência e morte nos deuses de pedra. Os grandes amadores de antiguidades restauravam por piedade, por piedade nós desfazemos a sua obra. Talvez nos tenhamos habituado de mais à ruína e aos ferimentos. Duvidamos de uma continuidade do gosto ou do espírito humano que torne possível a Thorvaldsen reparar Praxíteles.”
Marguerite Yourcenar, O Tempo, esse grande escultor
Praxíteles, Hermes
Thorvaldsen, Estátua de Copérnico, Varsóvia
“ Aceitamos mais facilmente que essa beleza, separada de nós, abrigada em museus e não já em nossas casas seja uma beleza etiquetada e morta. O nosso sentido do patético compraz-se nestas imperfeições; a nossa predilecção pela arte abstracta faz-nos amar estas lacunas, essas fissuras que neutralizam de algum modo o poderoso elemento humano desta estatuária. De todas as modificações causadas pelo tempo, nenhuma afecta tanto as estátuas como a alteração do gosto daqueles que as admiram.”
Marguerite Yourcenar, O Tempo, esse grande escultor
Giacometti
O Humano...de carne e osso
Dorothea Lange, Migrant Mother