sexta-feira, 8 de junho de 2007

E pur si muove...


Às vezes, ponho-me a pensar... Acho que o faço sobretudo para me convencer de que tenho muito tempo disponível. Claro que, depois, fico com menos tempo livre. Mas, não importa, nunca resisto à tentação de ludibriar a pressa, o corre-corre... Esse tempo que não sabemos se passa, mas o certo é que nós vamos passando... E pronto, esta cogitação toda acerca da imobilidade e do movimento, trouxe-me à ideia a figura incontornável de Galileu Galilei. O célebre autor da célebre frase: "E pur si muove..." Fantástica! E inesquecível, ao que tudo indica... Ela move-se! A Terra não está parada. Nós também não! Essa é que é essa!
É realmente muito incómodo quando alguém aparece com ideias novas e nos obriga a um novo olhar em relação a alguma coisa que temos por certa. Normalmente, gostamos de saber qual o chão que pisamos, "as linhas com que nos cosemos"... etc. Não deve ter sido agradável, na época, para muita gente, sobretudo gente importante, aparecer alguém a querer virar tudo de pernas para o ar. Estou a imaginar-me nesse tempo, estou a sentir a intolerância cá dentro. A vontade de dizer: "Loucura! A terra está bem parada, se assim não fosse, nada se equilibraria, etc..." No entanto, ele afirmou e provou que se movia. Hoje, sabemos bem que se move e toda a nossa perspectiva de vida se alterou face a esse passado tão distante, onde o modelo aristotélico-ptolomaico do universo configurava a estrutura mental dos grandes pensadores da época. Hoje, subjacente na nossa mente, está esta ideia do movimento da terra. Aliás, do movimento de tudo... E devemos isso a Galileu. Claro que também o devemos a Copérnico e até a Kepler. Mas Galileu foi para a frente com a ideia. E fez tudo para a provar. Tirou-nos da estabilidade confortável mas incongruente. Levou-nos mais além, projectou-nos para os confins do universo com a sua célebre luneta. Foi daqueles que quiseram saber mais... É por isso que admiro a sua honestidade intelectual. Para além das polémicas acerca de ter renegado ou não o que afirmou. Parece que preso ficou. É o que reza a história. Mas, embora preso, continuou a pensar e a trabalhar nos seus projectos.


Luneta de Galileu

Galileu devia ser um homem muito teimoso. E persistente. Para além de curioso e inteligente. Construiu a sua luneta e pôs-se a olhar os céus... Viu coisas que contradiziam tudo o que era tido por verdade indiscutível e de natureza sagrada, face à crença na criação divina. Fez cálculos, imaginou hipóteses, pensou experiências, realizou outras... Olhou de novo uma e outra vez, perscrutou os céus incansável. Finalmente, afirmou: "Copérnico está certo!". Deste modo, fez tremer a ordem instalada, introduziu uma ruptura no pensamento da época, levando esse pensar de então para uma nova orientação de sentido irreversível. Teimoso mas dinâmico. Tal como a terra e todo o nosso universo.
Agora, sabemos que somos grãozinhos de poeiras estelares, talvez... Pela sua agregação, surge a matéria, incluindo a de que somos feitos, a nossa "argamassa". Habitamos um planeta que gira sobre si próprio e à volta do Sol, em vez do contrário. Conhecemos, assim, um pouco melhor o nosso lugar no universo. Temos consciência de que somos pouco no meio de um universo imenso onde nem sequer parecemos estar em situação privilegiada (algures na "cauda" da Via Láctea). É certo que somos seres vivos e, por isso, possuímos uma complexidade especial. Mas nada nos garante sermos a única forma de vida inteligente, muito menos, a mais inteligente. Não sabemos. Precisamos de mais Galileus! Precisamos de quem consiga ver mais além... Precisamos de tantas coisas, enfim...

Esquecemos vezes infinitas que nos movemos, ao longo dos nossos dias, de cabeça para baixo e de pernas para o ar. Claro que não vemos isso, mas basta alguém conseguir sentar-se na lua ou mais realisticamente, ficar à janela nas instalações de uma estação orbital ou de um satélite (qualquer dia, será mais vulgar do que se possa imaginar), para vermos o mundo todo de "pernas para o ar"! Na verdade, ele já está mesmo assim. Ideia simpática ou não, é assim.
E há dias estranhos, dias nos quais, por dentro da normalidade quotidiana, nos sentimos sem "pés na terra", desafiando a lei da gravidade, de "cabeça no ar", em vez de sentirmos a gravidade a mantê-la no lugar adequado. Com massa, sim, mas sem peso. Livres. E ao mesmo tempo... não será isso que nos permite alargar horizontes? Ver tudo numa outra perspectiva? Galileu olhava incansavelmente o céu, sempre de "cabeça no ar". Olhos postos nos planetas, nas estrelas...Claro que isto só pode ser pontual. E em grande medida, metafórico. Ou seríamos projectados vertiginosamente para os confins do universo...
Mas fazem falta uns momentos de "cabeça no ar". É bom trespassar as nuvens e entrar na estratosfera. Se o céu estiver limpo, ainda melhor.
Contar estrelas é outra das minhas ocupações favoritas!

(imagens de autores desconhecidos)